Em menos de 72 horas, o ator Kevin Spacey passou de um dos atores mais respeitados do mundo do cinema, teatro e televisão a pivô de acusações de assédio sexual, com a carreira em frangalhos e pedindo um tempo para se tratar.
Após a primeira acusação, divulgada no domingo (29), de que teria abordado de forma indevida um ator adolescente há mais de 30 anos, ele revelou ser gay – e foi duramente criticado por ativistas LGBT, por ter, supostamente, usado sua sexualidade como “cortina de fumaça” para tirar a atenção das alegações de assédio sexual.
A exemplo do que aconteceu com o produtor de cinema Harvey Weinstein, seguiram-se novas acusações de assédio contra o ator, que ganhou dois Oscars – e é bastante conhecido pelo papel de Frank Underwood na série “House of Cards”.
“Kevin Spacey vai tirar o tempo necessário para buscar diagnóstico e tratamento”, informou um representante do ator à revista Variety.
Abaixo, a BBC revisita a trajetória do aclamado ator e elenca as alegações contra ele.
Rápida sucessão de eventos
No domingo (29), o site Buzzfeed divulgou as declarações do ator Anthony Rapp, que afirmou ter sido assediado por Spacey em 1986 quando tinha 14 anos. Na ocasião, Spacey tinha 26 anos.
Desde a revelação dos detalhes de como foi abordado por Spacey (“ele me carregou no colo como um noivo carrega a noiva… Então, se deitou em cima de mim”), houve uma rápida sucessão de eventos. No mesmo dia, Spacey pediu desculpas e assumiu ser homossexual.
Em seguida, vieram as críticas de grupos LGBT – e novas denúncias de assédio, como as do ator mexicano Roberto Cavazos e do cineasta Tony Montana.
Na terça-feira (31), o provedor global de filmes Netflix anunciou que suspendera as filmagens da sexta temporada de “House of Cards”.
E na quarta (1º), Spacey, hoje com 58 anos, anunciou que estava saindo de cena para se tratar.
As alegações continuam. Segunda a rede TV norte-americana CNN, vários integrantes homens da equipe de “House of Cards” reclamaram do ambiente “tóxico” no set por causa do comportamento de Spacey, marcado por assédio e outros abusos.
Início no teatro
“Segundo minha mãe, eu queria ser ator desde os sete anos”, disse Spacey este ano em Los Angeles. O ator era o caçula entre três irmãos. A mãe era secretária e morreu em 2003. Sobre o pai do ator, contudo, não se sabe muito. Ele morreu em 1992 e trabalhava como redator.
Spacey não fala do pai nem usa o sobrenome dele. Recentemente, o jornal britânico Daily Mail publicou um depoimento do irmão mais velho do ator dizendo que o pai foi membro do Partido Nazista dos EUA e abusava da família.
Spacey, que nasceu em Nova Jersey, considerava o também ator Jack Lemmon como “pai adotivo”. Foi Lemmon que o introduziu ao mundo das artes cênicas. Apesar de ter estudado na renomada escola de artes Julliard, em Nova York, Spacey demorou a conquistar fama.
Em 1986, quando ocorreu o episódio narrado por Rapp, Spacey atuava na Broadway, em Nova York, na peça “Longa Viagem Noite Adentro”, do dramaturgo americano Eugene O’Neill.
O reconhecimento no cinema veio em 1995, com o filme “Os Suspeitos”, dirigido por Bryan Singer. O papel rendeu a Spacey um Oscar de melhor ator coadjuvante.
A partir daí, o prestígio que já tinha conquistado nos palcos se estendeu a Hollywood. Spacey se firmou na carreira como ator sério, versátil e confiável.
Em 2000, Spacey ganhou mais um Oscar, dessa vez como protagonista, pelo papel no filme “Beleza Americana”.
Além do mais importante prêmio do cinema mundial, o ator ganhou um Globo de Ouro e um Tony. Foi indicado 11 vezes ao Emmy, a maioria das nomeações pelo papel de Frank Underwood em “House of Cards”.
Ele também dirigiu filmes – “Ciladas da Sorte” (Albino Alligator, 1996) e “Uma Vida Sem Limites” (Beyond the Sea, 2004) – e foi diretor artístico do tradicional teatro Old Vic, em Londres, por mais de dez anos.
Reservado
Quem conhece bem o ator, diz que Spacey gosta de uma boa conversa e imita atores clássicos como Jack Lemmon ou James Stewart com grande talento. No entanto, não gosta de falar de sua vida íntima.
Ele convivia com rumores e insinuações sobre sua sexualidade desde que alcançou a fama, nos anos 1990.
Em 1997, foi capa da revista Esquire, que teve o título “Kevin Spacey tem um segredo”. Dois anos depois, na tentativa de dissipar rumores, disse à revista Playboy que aquela reportagem o ajudou a conquistar mulheres que “queriam transformá-lo”.
Em 2000, já com o Oscar para Melhor Ator debaixo do braço, disse à apresentadora do programa de televisão americano “60 Minutes” que tinha um relacionamento com uma mulher chamada Dianne Dreyer.
Ainda assim, as especulações sobre a vida sexual do ator não pararam. E começaram a aparecer críticas da comunidade homossexual, que o acusava de covardia.
Assim como aconteceu com o produtor Harvey Weinstein, acusado de assediar sexualmente atrizes, modelos e funcionárias, as abordagens inapropriadas de Spacey a homens mais jovens não eram exatamente um segredo na indústria cinematográfica.
“Parecia que o Sr. Spacey se sentia livre para tocar qualquer homem desde que ele tivesse menos de 30 anos”, escreveu, no Facebook e no Twitter, o ator Roberto Cavazos, relatando que uma de suas supostas estratégias era convidar atores mais jovens para falar sobre a carreira e oferecer um piquenique com champanhe sobre o palco do Old Vic, “maravilhosamente iluminado”.
“Cada história variava do quão longe ele ia nesse piquenique, mas a técnica era sempre a mesma”, escreveu Cavazos no Facebook.
Vanguarda
A decisão do Netflix de suspender a produção de “House of Cards”, série que também é produzida por Spacey, coloca em suspense os próximos trabalhos do artista. Em dezembro, está prevista a estreia do filme “All the Money in the World”, dirigido por Ridley Scott, no qual Spacey interpreta o milionário J. Paul Getty. Não se sabe se a produtora do filme alterará os planos de divulgação para o longa disputar o Oscar em 2018.
O futuro da relação com o Netflix é incerto. Além de “House of Cards”, Spacey negociava com o provedor e plataforma de streaming um filme biográfico sobre o escritor americano Gore Vidal.
O ator foi uma das primeiras estrelas de Hollywood a apostar no potencial da plataforma de streaming. Pelo papel do maquiavélico Frank Underwood, Spacey se tornou um dos rostos mais conhecidas e principais promotores do Netflix.
Depois dele, outras estrelas se animaram a investir em projetos exclusivos para a internet.
A posição do Netflix não é fácil. Já se previa que “House of Cards” estava com os dias contados desde a saída de seu criador original, Beau Willemont.
A empresa já estava tendo de lidar com o “pepino” de sua relação próxima com Harvey Weinstein – e um outro escândalo certamente não ajuda.
Fonte: Cinema UOL
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