Trabalhar por dinheiro ou por amor? Essa sempre foi uma pergunta que atravessa gerações. Hoje, esta pergunta se modificou. Muitos na busca desse algo a mais que nos move, a sociedade tem repensado seus conceitos e buscado uma causa, um propósito. Essa é a história da moradora de Niterói, no Rio de Janeiro, Andrea Gomides. Ela liderou a área de vendas da HP e depois da Microsoft, já esteve algumas vezes nos EUA com o todo-poderoso da gigante da tecnologia, Bill Gates, e lidava diariamente com altos executivos da área de tecnologia. Mas não era isso que fazia seu coração bater. Ela dispensou o cargo promissor para montar sua ONG, diz que não ganha nem 10% do salário anterior e assegura: hoje, está mais feliz com a escolha que fez. Só hoje Andrea gerencia mais de 400 ONGs no país.
Sua escolha pelo terceiro setor, talvez já tenha nascido dentro de si. Andrea conta que já com sete anos de idade, se sentiu impactada quando visitou um orfanato com um grupo da escola: “Na volta para casa, lembro que perguntei à professora por que aquelas crianças não vinham com a gente no ônibus e me impactou saber que elas moravam ali, não tinham uma casa”.
Aos 20 anos, já cursando ciências da computação na PUC, passou uma semana numa comunidade carente em Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro, fazendo trabalhos diversos com crianças: brincadeiras, culinária, passeios. Em seguida foi para São Paulo e se envolveu com projetos sociais numa favela no bairro do Limão, na zona norte. Todo sábado, uma moradora conhecida como dona Maria abria as portas de uma escola pública para que os voluntários atuassem com a comunidade. Uma vez, a senhora não apareceu, e Andrea adentrou a favela em busca da casa dela. Encontrou dona Maria desfigurada. O marido a havia espancado.
“Ela ainda pediu desculpas por não ter aberto a escola”, lembra Andrea. Escolhi sair do ar-condicionado para vivenciar o que acontece com as pessoas A virada na sua vida veio logo após o episódio. Já no fim de 2006, Andrea foi convidada para coordenar uma ONG. E leu o livro “Saí da Microsoft para mudar o mundo”, em que o autor, o americano John Wood, conta como implementou a metodologia do mercado em sua organização sem fins lucrativos, foi aí que veio a inspiração e motivação que faltava para concretizar algo de maior valor para si.
No ano seguinte, deixou a Microsoft e São Paulo e passou 40 dias na Europa se especializando na área, dentro de uma organização. Voltou direto para o Rio de Janeiro e mergulhou por dois anos numa ONG, ajudando-a a estruturar seu projeto, de forma voluntária, investindo todas as suas economias. Nasceu então o Instituto Ekloos, registrado em 2009 e que hoje conta com 11 funcionários, dez mulheres e um homem.
A escolha rendeu, no início, olhares desconfiados, dificuldades e muita gente que achasse que não ia dar certo. Até hoje ela recebe convites para voltar ao mercado. Mas, prefere fazer o que acredita. “Cada iniciativa social multiplicada traz infinitamente mais felicidade que tocar o sino da Microsoft e dizer ‘bati minha meta de vendas’”, conta Andrea.
O Instituto Ekloos funciona como uma aceleradora social: ela senta com a organização que de alguma forma trabalha com impacto social, entende suas deficiências e capacita o grupo por nove meses. E de graça. O seu ganho, ela explica, vem de doações de empresas e parcerias. Ainda neste ano deve levar seu projeto para Salvador. A ligação com a capital baiana começou em 2018, quando ela ajudou a equipe do programa da TV Globo “Caldeirão do Huck” a montar uma creche por lá.
Cases de sucesso São muitas as histórias de sucesso que Andrea ajudou a construir, entre elas o Era Uma Vez o Mundo, da historiadora Jaciana Melquiades. Neste ano, ela abriu a primeira loja física no Rio dedicada a bonecas negras e brinquedos educativos sobre a história negra. Em breve, vai inaugurar um outro ponto, na estação do metrô Siqueira Campos, em Copacabana, zona sul do Rio. Ela também ajudou um ex-morador da favela da Rocinha a organizar a Estante Mágica, projeto que ajuda crianças de mais de 2.000 escolas públicas e particulares por todo Brasil a publicar livros. Robson Melo foi convidado pela Universidade Harvard, nos Estados Unidos, para explicar o seu modelo de negócio e tem hoje estimativa de faturamento de R$ 30 milhões por ano.
E, neste ano, o Instituto Ekloos em parceria com o Oi Futuro, instituto de inovação e criatividade da Oi, abrem o edital Impulso, um programa de aceleração que prevê mentoria e apoio a negócios de impacto social e iniciativas socioculturais do estado do Rio de Janeiro. Serão selecionadas até 20 iniciativas que tenham como propósito transformar a sociedade por meio da cultura, com premiação de até R$100 mil. Inscrições e informações no site do Instituto Ekloos (//www.ekloos.org/impulso) até 23h59 (horário de Brasília) do dia 20 de outubro.
Tem uma ideia transformadora e gostaria de pedir ajuda? Saiba como funciona:
Para participar do programa de aceleração de Andrea, primeiro, é preciso ter uma ideia. E, depois, se inscrever no site. A equipe analisa cada proposta e entra em contato. O blog da instituição também compartilha conhecimento, metodologias e dicas de como montar uma ONG. E tem mais: recentemente, Andrea lançou a agência Kio, para trabalhar com a comunicação das organizações. E oferece, ainda, um sistema de gestão chamado ONG Fácil, pelo qual a organização gerencia o investimento e acompanha a prestação de contas das ONGs online. “A gente nunca diz não porque as ONGs já ouvem isso frequentemente”, diz Andrea. “O que a gente faz é estudar um melhor caminho para viabilizar a ajuda possível.”.