Maria Antonieta virou vilã na Revolução Francesa, mas foi ela quem deu a França a imagem da sofisticação e moda que carrega até hoje.
No final desta coluna, você vai acompanhar uma intensa galeria que mescla história e contemporaneidade.
BAROQUE NOUVEAU
A moda não se cansa do estilo da Rainha da França.
O guarda infante ou crinolina, aquele suporte usado para sustentar as saias das francesas da época da corte apareceu em versões conceituais no desfile de Balenciaga 2020/21, criado por Demna Gvasalia, em tecidos metalizados.
Marc Jacobs também colocou em cena essa referência com tempero de subcultura, ao adaptá-la a uma versão Lolita, durante seu desfile na Semana de moda de Nova York para o verão 2020/21.
Christian Dior se inspirou na Rainha em muitas de suas criações e quando John Galliano era diretor de arte da casa, reprisou o estilo barroco de Maria Antonieta em diversas versões.
A Fendi no verão 2017 propôs um estilo rococó com brocados, maxi florais e sobreposições, bem ao estilo da Rainha.
Alexander McQueen, quando criava para a Givenchy, subverteu as perucas brancas colocando um modelo preto e volumoso em Naomi Campbell durante um desfile de 1997.
Vivienne Westwood ficou famosa com os sedutores corsets, ou espartilhos -que afinam a cintura e acentua o busto, e roupas literalmente copiadas do figurino da monarca.
Como prova que o estilo de uma das mais icônicas rainhas francesas não tem fronteiras no tempo nem no espaço, nas ruas de Tóquio e nos centros urbanos de todo o mundo, o estilo Lolita mantém viva e forte a inspiração da rainha dos brioches, em vestidos de saias volumosas e nas candy colors trabalhadas por grifes japonesas, como a Baby e The Stars Shine Bright.
O mesmo vale para os cabelos de estilo barroco, uma inspiração ainda presente em marcas contemporâneas. Os cabelos pouf, inventados por ela, ocuparam espaço no desfile de alta costura de verão 2019 de Valentino.
METAMORFOSES DE UMA IMAGEM
Para marcar os 226 anos de sua morte, a exposição “Marie-Antoinette, Metamorphoses of an Image” foi aberta dia 16 de outubro, data da morte da soberana, no mesmo local em que a rainha passou os últimos dias de confinamento, a Conciergerie no centro de Paris, com artefatos históricos raros, como documentos de julgamento e obras de arte modernas. A exposição enfatiza seu status de lenda e estará aberta até 26 de janeiro de 2020.
Em dois filmes cults inspirados na sua trajetória, “Maria Antonieta” (2006) – com Kirsten Dunst – e “Adeus Minha Rainha” (2013) – com Diane Kruger – é possível conferir um pouco da história da rainha da França, que teve seu reinado entre 1774 e 1791.
EM NOME DO GLAMOUR
Maria Antônia Josefa Joana de Habsburgo-Lorena (em alemão: Maria Antonia Josepha Johanna von Habsburg-Lothringen; francês: Marie Antoinette Josèphe Jeanne de Habsbourg-Lorraine) (Viena, 2 de novembro de 1755 – Paris, 16 de outubro de 1793) foi uma arquiduquesa da Áustria e rainha consorte de França e Navarra.
Décima quinta e penúltima filha de Francisco I, Sacro Imperador Romano-Germânico, e da imperatriz Maria Teresa da Áustria, casou-se em abril de 1770, aos quatorze anos de idade, com o então delfim de França (que subiria ao trono em maio de 1774 com o título de Luís XVI), numa tentativa de estreitar os laços entre os dois inimigos históricos.
Odiada pelos franceses na época de seu reinado, amada como um ícone pop nos últimos 20 anos, nos dias atuais, Marie Antoinette poderia talvez se tornar uma influenciadora austríaca ou um tutorial de cabelo YouTuber.
Mais contemporânea do que nunca, sua imagem aparece como uma marca do empoderamento feminino nesta época de superexposição.
Para manter o público curioso sobre sua próxima faceta, a rainha se reinventava constantemente. Facilmente seria uma estrela do Instagram, já que foi pioneira em um comportamento que hoje é comum entre os famosos. Ela fazia aparições estratégicas e vazava informações sobre seu modo de vestir.
Os estudos mostram que Maria Antonieta não foi uma mulher fútil e ingênua, mas uma mestra em usar o glamour como arma para se firmar numa corte estranha e hostil.
MINISTÉRIO DA MODA
Ela revolucionou a moda no século 18. A última rainha da França era uma lançadora de moda inquieta e contestadora.
Virar ícone de uma época – representar uma classe, um modo de pensar e de viver – é destino para poucas pessoas.
Maria Antonieta era uma mulher à frente de seu tempo, que usava a moda para expressar suas opiniões e pensamentos.
Para ela, a moda não se resumiu apenas em roupas luxuosas e tendências da época, e, sim, numa forma de comunicação, um meio de expressar sensações, sentimentos, indignações e, principalmente, protestar contra o que ela julgava errado.
Maria Antonieta entendeu que ser uma rainha significava essencialmente interpretar um papel. Mais que isso, ela logo descobriu que, por meio de mudanças na moda, ela podia modificar esse papel e até fugir dele.
Suas peças de vestuário, incluindo sapatos, perucas e acessórios, ocupavam nada menos que três cômodos do suntuoso Palácio de Versalhes, onde mantinha uma verdadeira legião de estilistas, costureiras e sapateiros a sua disposição.
O povo francês, relegado à imensa miséria enquanto a corte esbanjava em extravagâncias de todo tipo, costumava se referir ironicamente a este grupo como “O Ministério da Moda”.
Todos os dias, quando acordava, a equipe levava até ela um caderno contendo estampas de todas suas roupas para que ela pudesse escolher o que queria vestir sem precisar conferir suas inúmeras opções.
MADONNA BARROCA
A Rainha percebeu que o modo de vestir poderia ser o componente essencial de sua fama. Como a cantora Madonna, a rainha mudava constantemente sua aparência, ia dos penteados extravagantes as rústicas camisetes que usava em seu retiro particular, passando pelas andróginas silhuetas masculinas de montaria.
Ela se reinventava constantemente, uma maneira de manter o público curioso sobre sua próxima faceta. Também como Madonna, a rainha acendeu os debates nacionais sobre a sexualidade feminina, em época que as mulheres não tinham voz.
Quando queria exibir sua riqueza, surgia em público com vestidos suntuosos e penteados rocambolescos de quase 1 metro de altura.
Chocou ao vestir calças, até então exclusivas dos homens.
Deixou de lado os espartilhos de barbatana de tubarão e adotou peças leves para se aproximar dos camponeses.
Houve época em que a Rainha da França abandonou a indumentária luxuosa e chegou a usar vestidos simples, confeccionados inteiramente em algodão, acompanhado de um chapéu de palha.
Quando o rei foi condenado à guilhotina, a rainha passou a vestir-se apenas de preto, como sinal de luto profundo e uma forma de protesto.
Ao ser condenada à guilhotina, a Rainha da França vestiu branco. Com sua roupa, ela dizia aos revolucionários que eles haviam tomado a coroa, mas jamais quebrariam seu espírito.
ALTA COSTURA
Rose Bertin, costureira real e confidente de Maria Antonieta é considerada a primeira criadora de moda da história
Ela foi outorgada ministra da moda e foi o responsável pelo estilo da Rainha que fez da França o berço da moda.
Maria Antonieta tinha a seu serviço um criado apenas para cuidar dos seus 500 pares de sapatos, que estavam catalogados por data, cor e modelo, garantindo que nunca seria vista usando o mesmo par duas vezes seguidas. Alguns pares eram tão delicados que só podiam ser calcados enquanto ela estava sentada
As perucas usadas por ela pesavam mais de oito quilos e podiam ser de fios naturais, crina de cavalo, lã ou seda.
O cabeleireiro Léonard era criador e responsável pelos penteados-esculturas
O “pouf” era montado em uma estrutura de arame, que chegava a três metros de altura, firmado com pomada e talco, bem diferente dos fixadores atuais.
Confeccionadas por seis pessoas trabalhando arduamente, levavam quase uma semana para serem feitas e eram enfeitadas com pedras preciosas, plumas, espelhos, flores, frutas e legumes.
Sob essa estrutura, a cabeça da rainha ganhava temas diversos para cada ocasião, já que as perucas usadas em festas, raramente eram repetidas. Algumas perucas criavam cenas completas de algum evento, que incluía mobília, jardins e gaiolas com pássaros vivos.
Estas perucas brancas escondiam o cabelo natural de Maria Antonieta, um loiro claríssimo, quase platinado. Existem registros históricos que garantem que a rainha teria perdido a cor dos fios ao saber da iminente decapitação.
Apesar de ter possuído o maior guarda-roupas da Europa, poucos vestidos da rainha sobreviveram à Revolução Francesa. Entre as poucas peças de roupa, o destaque é a chemise usada durante os meses em que permaneceu na Conciergerie e que hoje se encontra exposta no mesmo local e uma túnica de seda na cor roxa, guardada secretamente por séculos, que teria sido costurada a partir de um robe utilizado pela rainha antes de sua execução.
Os pertences que foram preservados -inclusive o caderno com estampas de vestuário, ao longo do tempo, foram leiloados.
O último item arrematado, por US$ 65 mil, foi um par de sapatilhas verde e rosa. O lance final surpreendeu até mesmo a casa de leilões Paris Druout, já que a oferta inicial era de US$ 13 mil.
Mesmo às vésperas da Revolução Francesa, quando o país mergulhava em uma profunda crise, a regra entre as mulheres do Palácio de Versalhes era uma só: inspirar-se no estilo Maria Antonieta, a rainha que se imortalizou não por seu papel na história política, mas como um dos maiores ícones de estilo de todos os tempos.
Galeria – Crédito das imagens: Reprodução