E o carnaval foi embora levando amores e dissabores, trazendo amores e esperanças para um novo ano. Muitos guardam com as fantasias as lembranças de um beijo roubado, um sorriso que ganhou, um olhar de desejo, um tombo engraçado, abraços saltitantes embalados por uma música em comum e os voos desmedidos onde o céu é o limite.
Assisti uma escola do primeiro grupo, evoluir com determinação e amor, rumo ao grupo de acesso, uma certeza em cada coração que se dedicava aos ensaios com um comprometimento inabalável. Pude sentir ao desfilar ali pelas ruas da Mooca, e na segunda feira no sambódromo de São Paulo, um só objetivo em comum, todas as pessoas cantavam para ganhar. “Carrego no peito um amor de verdade, a Mooca é raiz é felicidade. Meu chão de estrelas vai brilhar, vai deixar saudade quando eu desfilar…” Quando esse refrão ecoava, os pelos do corpo também se manifestavam em um arrepio emocionado.
Assisti a comunhão de pessoas nos blocos espalhando sorrisos e olhares, chegando junto, uns se reconhecendo em outros. Com as suas fantasias, buscando a alegria de pelo menos naquele momento ser uma bailarina, uma vaca, uma estrela, uma mulher maravilha, uma mulher gata, ou simplesmente se permitir estar com purpurina espalhada pelo corpo, um arco de flores no cabelo, uma maquiagem artística e ousada, uma bela boca vermelha sorridente. Vale tudo por esses momentos de felicidade plena, sem pensar, obedecendo apenas ao instinto de voar ao som das músicas escolhidas atenciosamente por cada bloco.
Assisti a diversidade sendo tema em todas as rodas de conversas, vi beijos ardentes e abraços calorosos sendo trocados por casais livres em suas escolhas, vi as Drags mais luxuosas em seus desfiles glamorosos arrastando uma multidão, momento inesquecível, todo mundo junto e misturado, em um único propósito: Se divertir a valer.
Na rua não há classe social, não há raça, ou cor de pele, não há preconceito. Todos estão ali para esquecer através da liberdade permissiva do Carnaval, serem quem quiserem ser, exercer verdadeiramente a sua liberdade de expressão, afinal, é carnaval e tudo passa como uma grande brincadeira. Claro que existem os momentos tristes dessa festa profana onde pessoas aproveitam para usar a sua pior fantasia: a de bandido, como nos filmes de faroeste. Eles acham que esse é o momento para tirar a alegria do folião, pois na distração, o melhor de nós também aparece e não enxergamos a maldade do outro, não percebemos esse “bandido” que se aproxima brincando também. Ele rouba não só o bem material, mas o sentimento de felicidade que estava sendo vivenciado. Mas é carnaval…
Assisti feliz, crianças e famílias poderem brincar dentro de seu território maternal, com blocos feitos para elas, no tempo e na imaginação delas, com segurança e amor.
Assisti profissionais trabalhando e fiquei feliz de contribuir para que mais uma família pudesse através do carnaval levar comida pra casa. A festa não é só para se divertir, para muita gente é fonte de renda. Não estou falando do comércio formal, nem do turismo, nem dos camarotes e eventos espalhados pela cidade, isso a gente já sabe que acontece, estou falando dos ambulantes que vendem de tudo ali na rua para tornar o carnaval mais aproveitável, que se desdobram criativamente para vender acessórios, maquiagens, customização de camisetas na rua, bebidas diversas e até fantasias improvisadas. E mesmo trabalhando se divertem felizes.
O ser humano quer ser feliz. E mesmo não sabendo diante de uma realidade crua e dura, como fazer essa felicidade não acontecer só em uma festa popular, ele intuitivamente começa a preparar a próxima folia, quer levar essa felicidade e esperança para o seu cotidiano, por isso o carnaval acaba externamente, mas lá dentro ele continua se entregando arduamente e em qualquer momento que pode, volta a ser um folião.
Vamos fazer de 2107 um ano cheio de amor, alegria, paz e foliões de corações puros, éticos e generosos, vamos plantar a semente da empatia em cada coração e assim aos poucos e com paciência, quem sabe, sermos Mais Influentes e exterminarmos definitivamente as fantasias de “bandidos” que muitos insistem em vestir.